Notas sobre preparação e competição no remo

Por Ricardo Diefenthaeler (Gari)

A literatura sobre o remo, outrora escassa e pouco acessível, começa a se tornar mais corrente, sobretudo nos EUA e na Inglaterra, permitindo aos que não são técnicos de remo mas que tem algum conhecimento prático tenham acesso a informações técnicas e de treinamento. Buscando consolidar informações colhidas em um conjunto pequeno mas abrangente de publicações, tomei algumas notas para uso pessoal e, percebendo que poderiam ser úteis a outros remadores e aficionados ao remo, as organizei no material que se segue.

1. NOTAS SOBRE FISIOLOGIA

Depois da técnica, talvez o fator mais importante para atingir velocidade no remo é capacidade do remador em produzir/utilizar energia e de tratar os subprodutos dos processos de produção/utilização.

1.1 ATP e Sistemas de Produção de Energia

O ATP é a fonte imediata de energia para as células dos músculos, que produzem movimento através de sua contração. Boa parte do trabalho de condicionamento físico é dirigido à capacidade do corpo para produzir, usar, armazenar e transportar e resintetizar ATP. As moléculas de ATP produzem energia através de ciclos contínuos, em que elas são “quebradas”, produzindo energia, e são resintetizadas novamente em novas moléculas de ATP. Existem três tipos de ciclos de ATP, cada qual com um tipo de fonte e de subprodutos gerados:

Sistema “fosfogênico”: anaeróbico (produz energia sem oxigênio), tem pouca importância para remadores porque sua fonte é suficiente para um máximo de somente 10 segundos em máximo esforço.

Sistema de ácido lático: anaeróbico (produz eneregia sem oxigênio), usa o glicogênio (açúcar armazenado no fígado e nos músculos) como fonte. Ele é “quebrado” sem a utilização de oxigênio através de um processo chamado glicólise anaeróbica, gerando como subproduto o acido lático. Este processo é bastante ineficiente na produção de energia, já que produz o equivalente a 1/13 do que é produzido com a mesma quantidade de acúcar no processo aeróbico. Por outro lado, é uma fonte rápida de energia para exercícios intensos mas de curta duração. Esse processo se esgota em um período de 2 à 3 minutos de esforço intenso, não pelo esgotamento da fonte (glicogênio), mas porque a capacidade do corpo de suportar a acumulação de ácido lático gerado pelo processo atinge seu limite. Desta forma, a tolerância do corpo ao ácido lático é que limita o processo.

Sistema aeróbico (produz energia com oxigênio): é o mais importante e eficiente sistema de produção de energia do organismo, produzindo 75% do total de energia utilizada em uma prova de 2.000 m (o fosfogênico produz 5% e o de ácido lático, 20%). O limite desta forma de produção de energia está na capacidade de absorção de oxigênio pelo organismo. Quando o limite é atingido, a produção de energia passa a ser anaeróbica. Este processo não produz ácido lático como subproduto, mas sim água.

Em uma atividade física um atleta não utiliza apenas um sistema isoladamente, mas pelo menos dois dos três sistemas simultaneamente. Numa prova de 2.000 m, por exemplo, nos primeiros 60 a 90 segundos o remador estará utilizando os sistemas fosfogênico e de ácido lático. A partir daí, o sistema aeróbico começará a ser utilizado juntamente com o de ácido lático. O aeróbico vai crescendo em utilização e o de ácido lático diminuindo até por volta dos primeiros 3 minutos, quando a situação se estabiliza em 95% aeróbico e 5% ácido lático. No último minuto, com o sprint final, há um crescimento no uso do sistema aneróbico para +- 15%.

1.2 Limiar Anaeróbico (Anaerobic Threshold – AT)

O limiar anaeróbico é o mais importante conceito de fisiologia relacionado à preparação de remadores. Em uma definição simples, o limiar anaeróbico – AT é o ponto em que a demanda de energia sobre o corpo não pode ser atendida integralmente pelo sistema aeróbico. Neste ponto, o corpo começa a produzir energia tanto pelo sistema aeróbico quanto pelos anaeróbicos. Quanto maior o AT de um atleta, mas energia ele poderá produzir antes de gerar ácido lático em quantidades significativas. O limiar anaeróbico de um atleta é medido em esforço, através de seu consumo de oxigênio ou pelo monitoramento de seus batimentos cardíacos.

O AT de um atleta tem um componente genético (quando maior a percentagem de fibras musculares de contração lenta, maior o AT), mas pode ser melhorado em até 50% através do treinamento.

1.3 Dicas sobre Alimentação

Principal fonte de glicogênio são os carboidratos. O remo requer muito carboidrato;

A gordura tem alto valor energético mas consome muito oxigênio para gerar a mesma quantidade de energia. Assim, a gordura só será uma importante fonte caso se reme a 25% de força por longos períodos;

Quem tem uma dieta equilibrada não deve gastar dinheiro com suplementos de vitaminas. Talvez a única exceção seja a vitamina C (atletas que praticam esportes de resistência necessitam de 3 a 5 miligramas de vitamina C por kilo por dia);

Mulheres, especialmente pesos-leve, necessitam significativas quantias de cálcio e ferro;

Durante treinos fortes em ambientes úmidos e quentes, um atleta perde até 2 litros em suor por hora. O líquido consumido, mesmo se o atleta bebe líquidos em grandes quantidades, só é reposto pela metade. Por isso, é preciso grande cuidado para não se desidratar;

Antes de competições, o melhor é uma alimentação leve e baseada em carboidratos.

2. NOTAS SOBRE PREPARAÇÃO

O remo é um dos esportes que mais demandam fisiologicamente do atleta em todos os sistemas e energia (fosfogênico, de ácido lático e aeróbico) e em todos os músculos. É um esporte de movimento repetitivo, usando maiores e menores músculos nas pernas, nádegas, parte inferior e superior das costas, ambodmen, peito, ombros e braços. Uma particularidade do remo é a alta quantidade de energia demandada em uma largada, o que produz alta quantidade de ácido lático já no início da prova.

Os requisitos físicos do remo, que precisam ser trabalhados no treinamento, incluem cinco categorias (capacidade aeróbica, capacidade anaeróbica, resistência muscular localizada, força e flexibilidade), tratadas nos itens a seguir.

2.1 Capacidade Aeróbica

A melhor maneira de testar a capacidade aeróbica de um atleta (o limiar anaeróbico e a absorção máxima de oxigênio) é através de um sistema computadorizado com analisador de gás e marcador de freqüência cardíaca. Caso o remador não tenha acesso a esse equipamento, poderá testar utilizando apenas um ergômetro e um marcador de freqüência cardíaca. O protocolo é o seguinte:

Reme 10 minutos de aquecimento;

Reme 5 minutos a 125 watts (procure ficar o mais próximo possível do alvo – 125 watts). Registre a pulsação atingida no final dos 5 minutos;

Suba 25 watts por minuto e registre a pulsação nos 5 segundos finais de cada minuto;

Repita o item 3 até não poder mais continuar;

Relaxe remando fraco.

Monte uma tabela e um gráfico tempo x watts x pulsação a partir dos dados colhidos a partir do item 2. Verifique qual é o ponto de inflexão (ponto em que o incremento de pulsação deixa de ser proporcional ao incremento em watts, passando a ser menor). Este ponto é o seu limiar anaeróbico (Anaerobic Threshold – AT ), tanto em pulsação quanto em watts.

Tendo determinado seu AT e a capacidade máxima de absorção de oxigênio, o remador deve treinar para expandir estas medidas, que são críticas para os bons resultados. Para melhorar a capacidade máxima de absorção de oxigênio, os trabalhos indicados são peças de remo longo à baixa intensidade de pelo menos 20 minutos e peças mais curtas de intensidade um pouco mais alta (10 batimentos abaixo do AT) com 1 ou 2 minutos de intervalo. Ao menos uma vez por semana, é interessante um treino bastante longo, com ritmo constante (steady state), sendo possível substituir o remo na água pelo ergômetro ou bicicleta.

Para expandir o AT, o treino deve ser feito tão próximo quanto possível do AT. Um treino clássico é o de 3 x 20 minutos com alguns minutos entre cada peça. Se 3 x 20 minutos for demais, pode-se fazer 3 x 15 ou 2 x 20. Outro treino interessante é 5 x 8 minutos com 2 minutos de intervalo entre cada peça. É importante fazer dois treinos de AT por semana fora da temporada e um durante a temporada.

O AT irá evoluir conforme o treinamento, por isso é importante verificar o AT uma vez a cada 6 semanas para ajustar adequadamente os treinos.

2.2 Capacidade Anaeróbica

Capacidade anaeróbica é a capacidade do atleta em produzir energia no sistema aneróbico, bem como suportar a acumulação dos subprodutos desta forma de produção de energia (notadamente o ácido lático).

A melhor maneira de desenvolver a capacidade anaeróbica é o interval training, método em que se trabalha em um ritmo superior ao de competição por períodos menores do que o de competição. Este tipo de treino faz com que o atleta se acostume, tanto fisicamente quanto mentalmente a altos níveis de esforço. Outra vantagem é permitir que o atleta realize muito mais trabalho de velocidade, apesar de em quantidades menores, do que faria se remasse continuamente.

Em uma sessão de interval training a pulsação do atleta chega próxima ao máximo durante o esforço e em torno de 110 a 120 bpm no intervalo. A carga deste tipo de treinamento vai crescendo semana a semana conforme se aproxima a competição principal focada no plano de treinamento. Não se deve, no entanto, fazer mais de 3 treinos intensos deste tipo por semana. Além disso, é importante manter um bom intervalo de descanso entre cada treino.

Muitos atletas exageram na quantidade de interval training no seu treinamento, supondo que tudo o que causa sofrimento deve ser positivo. O resultado é a exaustão e um decréscimo de desempenho. Outra observação importante é que para se começar este tipo de treinamento é imprescindível uma boa base aeróbica e uma boa quilometragem de treinos longos. Isto reduzirá a possibilidade de lesões e preparará a musculatura para trabalhos de alto esforço.

Um teste para avaliar a capacidade anaeróbica de um remador usando um ergômetro é a descrita a seguir. Trata-se de um teste duro mas muito útil.

Tome a sua marca de AT em watts e adicione 30 (ou 60 se você é um atleta de alto nível). Este será o seu alvo para o teste;

Aqueça bem (registre o que você fez para aquecer para repetir com precisão em testes futuros);

Pare, resete o ergômetro e dê uma largada de forma a prontamente atingir o alvo em watts;

Siga remando no alvo até não mais conseguir sustentar a potência alvo (em um ponto em que a potência cai para abaixo de 10 watts do alvo). Registre o tempo decorrido e o trabalho total executado (em watts)

O tempo decorrido é uma maneira relativa de quantificar sua tolerância à acumulação de ácido lático e a potência total é uma indicação da quantidade de potência que você consegue produzir em níveis altos de esforço. Em um teste futuro o AT poderá ter evoluído e o alvo, assim, não será o mesmo. Desta forma, o tempo do teste poderá não evoluir, mas a potência total terá crescido.

2.3 Resistência Muscular Localizada (Endurance)

A resistência muscular localizada é a capacidade de executar repetidamente um movimento específico empregando grande potência. Para o remador, é muito importante para ele consiga remar com qualidade nos metros finais da prova. Nas provas de longa distância, a importância é ainda maior.

Talvez a melhor maneira de desenvolver a resistência muscular localizada é remar distâncias muito longas, mas isto pode prejudicar a técnica devido à dificuldade de manter a atenção à Técnica por longos períodos. Outras maneiras são circuitos (sem peso), subidas de escadarias (especialmente bom para a resistência nas pernas) e remada na mesa.

2.4 Força e Potência

A força explosiva depende sobretudo do tipo de fibras musculares (quanto maior a porcentagem de fibras de contração rápida, maior força explosiva o atleta terá). A força na parte superior do corpo é particularmente importante para remadores de remo duplo devido à alta carga à qual esta parte do corpo é submetida no final da remada.

O trabalho com pesos, feito corretamente, pode favorecer significativamente a eficácia da remada. Os exercícios realmente úteis para o remo são aqueles que simulam com bastante proximidade os movimentos da remada ou trabalham os músculos antagônicos.

Para desenvolver a força deve-se usar cargas altas e poucas repetições (séries de no máximo 8 repetições). Deve-se chegar ao ponto em que não se consegue mais executar o exercício: o aumento de força vem do ponto em que se atinge a falha. Não se deve fazer este tipo de treino mais do que uma vez por semana.

Uma maneira simples de indicar o tipo de fibras predominantes em um atleta é o teste de impulsão:

se o resultado for inferior a 18 polegadas para o homem e 12,5 para a mulher, o atleta terá um número acima da média de fibras de contração lenta;

se o resultado for inferior a 24 polegadas para o homem e 15,75 para a mulher, o atleta terá um número acima da média de fibras de contração rápida.

2.5 Flexibilidade

Um remador flexível é capaz de atingir a máxima compressão facilmente e sem forçar os músculos e tendões. A flexibilidade é o fator de condicionamento mais freqüentemente esquecido pelos remadores. Todos remadores sabem que devem fazer mas poucos, de fato, fazem. Eles pensam que seu tempo pode ser melhor aproveitado numa atividade “mais física”.

É preciso lembrar, no entanto, que o trabalho de flexibilidade ajuda a relaxar a musculatura e a estender tendões, reduzindo a possibilidade de lesões e as dores 24 ou 48h após trabalhos duros. Além disso, melhora a condição de remadores com pouca capacidade de alongamento em áreas cruciais para o remo, como a parte baixa da coluna e os tornozelos. Finalmente, a flexibilidade é vital para preservar a capacidade de remar quando o remador vai envelhecendo.

Os exercícios de flexibilidade devem ser feitos antes e depois dos treinos, preferencialmente após um rápido aquecimento (como, por exemplo, 5 minutos no ergômetro). Faça alongamentos longos, lentos e sem pequenas forçadas, por aproximadamente 20 a 30 segundos. Antes de remar, trabalhe a cabeça, o pescoço, a parte alta e baixa da coluna e os tornozelos. Após, trabalhe os principais grupos musculares. Se você não dispõe dos 20 minutos de alongamento geralmente recomendados, ao menos não deixe de fazer os 3 ou 4 principais alongamentos.

Os principais itens de flexibilidade a avaliar em um remador são as pernas e o tornozelo:

Pernas e parte baixa da coluna: ficando de pé sobre um degrau flexione as costas e estique os braços em direção aos pés. Se você passar dos dedos dos pés, tem uma boa flexibilidade;

Tornozelos: se você consegue ir a proa sem levantar os calcanhares mais do que uma polegada, você tem uma boa flexibilidade;

2.6 Programas de Treinamento

Se o remador tem a intenção de competir ou melhorar a sua condição necessita de planejamento, caso contrário não terá evolução. O segredo para um programa de treinamento efetivo e eficiente é projetá-lo para incorporar tanto a parte fisiológica quanto a técnica. Muitos remadores erram ao concentrar-se quase que exclusivamente na parte fisiológica, relegando o trabalho técnico ao aquecimento e aos treinos de longa distância.

Um plano deve incluir as regatas que se quer disputar, aquelas nas quais o remador deseja estar no seu pico de condicionamento (o pico é atingido no máximo 2 vezes ao ano), bem como as avaliações periódicas.

O primeiro passo na elaboração de um plano de treinamento é a determinação de metas, de condicionamento físico, técnico, de satisfação pessoal e de participação nas competições. Se o atleta não consegue identificar suas metas, não poderá saber como alcançá-las nem poderá perceber quando as atingiu. As metas podem ser revisadas no decorrer do período, de acordo com a evolução no treinamento, lesões e problemas de agenda. Na definição das metas deve-se ser tão específico quanto possível e ser ousado mas realista. Metas como “Eu quero ser mais rápido” são vagas e de difícil aferição. O melhor seria “Eu quero estar fazendo 2.000 metros em 7:20 na época do Campeonato Nacional”.

Um conceito básico relacionado aos planos de treinamento é o de ciclo. Existem dois tipos de ciclos: “micro” e “macro”. Um microciclo se constitui de uma seqüência de seções de treinamento realizadas em um período (tipicamente uma semana), organizada de forma tal que o atleta possa treinar intensamene, recuperar-se e treinar intensamente novamente, minimizando as chances de sobretrabalho e burn-out. Um macrociclo é o plano de trabalho um período grande, tipicamente composto pela preparação fora da temporada de competições (em que se enfatiza o trabalho de técnica e de condicionamento aeróbico) e pelo trabalho durante a temporada (em que se enfatiza o trabalho de velocidade).

A seguir é apresentado a base dos planos de treinamento para um macrociclo de um ano. Observe-se que esta base é dirigida para os EUA, Canadá e Europa, onde o forte inverno faz com que o calendário seja bem demarcado, com as competições principais se concentrando em junho, julho e agosto.

1º e 2º mês: enfatiza-se o trabalho sobre a capacidade aeróbica (aumento da capacidade máxima de absorção de oxigênio) e para o aumento da força (potência muscular);

3º e 4º mês: enfatiza-se o trabalho para expansão do limiar anaeróbico (AT) e para o aumento da força (potência muscular), mantendo o trabalho sobre a capacidade aeróbica e adicionando trabalho para resistência muscular localizada no 4º mês;

5º mês: é um mês de transição, permanecendo a ênfase sobre a expansão do limiar anaeróbico mas com crescimento no trabalho de resistência muscular localizada e introduzindo alguns trabalhos curtos mas intensos uma ou duas vezes por semana;

6º: o trabalho passa a se tornar mais dirigido às regatas, com trabalhos de interval training com intervalos longos misturados com trabalhos de expansão do limiar anaeróbico e treinos de longa distância em estado constante (steady-steate). O trabalho de força é mantido;

7º: enfatiza-se o trabalho sobre a capacidade anaeróbica, com aumento gradual na intensidade. O trabalho de força é mantido;

8º e 9º mês: é o período de competições, com preparação específica e simulação das provas. Muitas peças de tolerância ao lactato (que são mais curtas – 1 minuto – e com alta intensidade). Os interval trainings devem ser combinados com treinos de longa distância em estado constante (steady-steate) para ajudar na recuperação do remador e na manutenção da técnica;

10º mês: mesmo que seja um período ainda de competições, deve-se diminuir significativamente os trabalhos de alta intensidade, mantendo no máximo um treino intenso por semana. Dificilmente o condicionamento irá melhorar e o risco de sobretreinamento é alto;

11º e 12º mês: neste período deve-se enfatizar a manutenção do condicionamento e aprimorar a técnica.

Observe-se que é muito a dosagem dos treinos é um fator primordial de sucesso na execução de um plano. Os remadores tendem a acreditar erradamente que um pouco é bom, muito é bem melhor (“no pain, no gain”).

3. NOTAS SOBRE COMPETIÇÃO

O remador aumentará sua chance de sucesso em competições se tiver fixado suas metas, planejado de forma efetiva e executado seu treinamento de forma consciente. Não há atalhos.

Para fixar uma estratégia de competição são levados em conta as características psicológicas, mentais e técnicas do(s) remadores, bem como as circunstâncias da competição. Observe-se que diferentemente de outros esportes, nas regatas os atletas iniciam a prova na linha de largada com um sprint. A estratégia largar forte – baixar para percurso – levantar no final é psicológica e fisiologicamente irracional, mas, devido à natureza das regatas, parece ser o método mais utilizado. Seguem as principais táticas de competição utilizadas:

Tática Ofensiva: se adapta melhor guarnições agressivas e com boa largada. Nesta tática, é dada uma largada rápida de mais ou menos 40 remadas, o que deve produzir uma liderança segura. Baixa-se então para ritmo de percurso e controla-se eventuais levantadas dos adversários. É uma tática que dá confiança se o plano dá certo, mas pode ser perigosa se um adversário também usá-la ou se o sprint inicial levar a um desgaste excessivo;

Tática Defensiva: se ajusta bem para guarnições mais lentas mas mais estáveis. A guarnição põe esforço máximo no meio da prova, especialmente dos 800 aos 1.500 metros. Este movimento tende a derrubar guarnições ofensivas, que neste ponto já acumulam desgaste;

Sprint Final: rema-se 1.500 metros em ritmo tal para que a guarnição não perca contato com os líderes e inicia-se um sprint forte nos últimos 500 metros. Esta tática tende a surpreender os adversários e fazer com que eles prestem mais atenção na guarnição que fez o sprint do que em si própria;

Parcelas Iguais: rema-se cada parcela de 500 metros da prova em tempos iguais. A guarnição pode até não vencer mas terá feito o tempo mais baixo possível. Esta é a tática mais inteligente, lógica e bem sucedida mas também a mais difícil de executar. Parte do princípio que o fator mais importante para vencer uma regata é velocidade sobre a distância. Karl Adam, famoso treinador alemão, advogava que este tática é a que dá maior velocidade a um determinado esforço em função da lei dos retornos decrescentes (quanto mais rápido o barco se desloca, maior a resistência). Além disso, altas taxas de ácido lático são produzidas para um pequeno aumento de velocidade. Peter Karpinnen, singlista finlandês três vezes campeão olímpico, é um bom exemplo da efetividade desta tática. Observe-se no entanto que é preciso estar muito bem preparado psicologicamente para sustentar esta tática quando os adversários disparam à frente. Assim, esta tática se adequa bem àquela guarnição que sabe que é a mais rápida entre as adversárias (ou pelo menos está bem próximo da mais rápida).

Observe-se que tendo uma estratégia básica em mente, talvez seja necessário adaptá-la às circunstâncias: características dos adversários, se há vento de ré, de lado ou de proa (neste último caso pode ser prudente remar com voga duas remadas mais baixa), seu estado geral na hora da competição.

Antes da prova: deve-se verificar todos os detalhes (confirmar inscrição e baliza, verificar barco, remos e equipamentos), cuidar o andamento das provas precedentes, o horário e buscar alta concentração, elaborando mentalmente todos os detalhes da prova;

Aquecimento: finalize o aquecimento que você costuma fazer em terra de modo a ir para a água 30 minutos antes da prova. É normal sentir-se cansado ou fraco conforme após afastar-se da rampa: é conseqüência da adrenalina que começa a circular. Planeje seu aquecimento na água de forma a estar na partida tão logo o finalize, de modo a estar um pouco ofegante na hora da saída;

Largada: as coisas acontecem muito rapidamente na largada; por isso, assegure-se de ter feito todos os passos preparativos antes. A largada é uma parte crucial da prova: a guarnição deve dar o tom para o resto da prova, remando de forma relaxada, suave mas muito potente. Durante as primeiras remadas, cada remador deve assegurar-se de estar empurrando firmemente as pedaleiras e puxando os remos na altura correta. Os remadores não devem olhar para os lados: o posicionamento com relação aos outros barcos ainda não fazem diferença. O número de remadas em voga de largada pode variar bastante (de 10 à 40), tendo maior importância a qualidade destas remadas. Não fique alarmado se você se sentir péssimo boa parte dos primeiros 500 metros. No primeiro minuto toda energia consumida será produzida pelo sistema anaeróbico e você sentirá os efeitos;

Transição: a transição do ritmo alto da largada para o ritmo de percurso é uma das partes mais importantes da prova. Se for executada com qualidade, haverá apenas uma pequena perda de velocidade na transição da voga alta para uma voga mais baixa e eficiente. Na transição você tem a chance de relaxar, tomar um ritmo, concentrar-se em sua remada e, talvez, verificar sua posição na prova. A tendência natural da transição é fazê-la de forma gradativa, em várias remadas. Mas a transição em apenas uma remada é mais interessante. Faz-se a largada e determina-se uma remada como de transição. Quando ela

chegar, simplesmente diminui-se a velocidade do carro, mantendo a mesma velocidade no afastamento, a mesma intensidade na puxada e o mesmo trabalho de pá;

Segunda Parcela de 500 metros: se você ainda não conseguiu relaxar, nesta parcela está sua última chance. Nada de muito significativo tende a acontecer nesta parte da prova. As guarnições guardam energias para a próxima parcela;

Terceira Parcela de 500 metros: aqui você começa a se sentir realmente cansado (se isto não acontecer, é sinal de que você não remou forte o suficiente). A maioria das provas são ganhas ou perdidas nesta parte. Muitas guarnições fazem seus movimentos táticos aqui. Se você decidiu forçar nesta parte, faça um esforço consistente que o faça tomar vantagem consistente sobre os adversários. Caso contrário terá acumulado um débito de oxigênio, o que será percebido por seus adversários;

Quarta Parcela de 500 metros: em algum ponto dos últimos 500 metros, você se verá diante da decisão de fazer ou não e quando fazer um sprint. A resposta mais

fácil é apenas fazer uma levantada se há real necessidade e de só fazer se você conseguir manter o sprint até a linha de chegada. Se você está na liderança, não faça um sprint: fazê-lo apenas aumentará a chance de você cometer um erro que pode ser fatal. Observe que muitas guarnições diminuem a velocidade com uma levantada, porque correm de carro, degradam a técnica e encurtam a remada. Para evitar isto, a guarnição deve relaxar e se concentrar na técnica antes da levantada e, então, começar a afastar mais rápido. Outra maneira é concentrar-se em aumentar a potência da puxada.

4. TREINANDO E COMPETINDO DEPOIS DOS 30

O remo tem crescido significativamente em popularidade entre as pessoas com mais de 30 anos. Isto talvez se explique pelo fato de o remo ser, juntamente com a natação, o esporte que proporciona melhor desenvolvimento físico geral. A alta taxa de consumo de calorias, o aumento da massa muscular, o incremento da resistência física, da flexibilidade e da coordenação motora, conjugado ao baixo risco de lesões, fazem do remo a melhor opção para quem busca no esporte uma fonte de saúde e satisfação.

A performance de um atleta após os 30 anos inegavelmente decresce. A diminuição da freqüência cardíaca máxima, o volume de sangue que o coração bombeia em uma contração e a capacidade dos pulmões fazem com que a capacidade aeróbica do atleta se reduza de 8 a 10% por década após os 30 anos. A potência aeróbica, a energia e força também se reduzem com a idade, assim como o tempo de reação e a agilidade.

Outro ponto importante de decréscimo é a capacidade de recuperação de lesões. Muitas das lesões sofridas por remadores masters estão relacionadas ao “sobreuso”. Bursite, músculos distendidos e dores nas costas são lesões bastante comuns. É preciso passar a ouvir o próprio corpo de forma muito atenta. Muito cuidado deve ser tomado com o sistema cardiovascular, especialmente se o remador remar em ambientes excessivamente frios ou quentes. Um problema muito comum entre os masters é a osteoartitre, especialmente na parte inferior da coluna. Uma dica interessante para remadores masters é procurar médicos que estejam acostumados a tratar atletas e entendam suas particularidades, evitando aqueles que lidam apenas com pessoas doentes. Para os sedentários com mais de 35 anos é imprescindível uma avaliação médica antes de (re)iniciar a prática do remo, sobretudo se fumam, estão acima do peso ou têm pressão alta.

Como ponto positivo, é comum que um remador mais velho se sinta melhor preparado mentalmente do que quando era mais novo. Quanto mais experiência se adquire, maior a capacidade de suportar o stress do treinamento e mais inteligentemente o atleta treina e compete.

Seguem algumas dicas:

Siga um plano de treinamento, mantenha registros dos treinos e faça avaliações periódicas para medir sua evolução;

Treine de forma inteligente e cuidadosa, lembre-se que você não tem mais 20 anos;

Uma das coisas mais importantes para evitar lesões em remadores masters é o aquecimento;

Se você parou de treinar por algum tempo, tome 3 ou 4 semanas para readaptação;

Nunca deixe de fazer alongamento: a economia de alguns minutos pode resultar em lesões difíceis de curar;

Dê tempo para o seu corpo se recuperar após os treinos. Lembre-se de que seu corpo somente evoluirá se você permitir que ele descanse e se recupere;

Se o seu objetivo são provas de 1.000 m, enfatize o treino anaeróbico.

Seja realista, tente remar 4 ou 5 vezes por semana. Um escalonamento maior provavelmente não se sustentará sem prejuízos em sua vida profissional ou pessoal;

Problemas como falta de tempo, viagens à serviço e compromissos familiares podem ser contornados com criatividade, minimizando o efeito nos treinamentos (por exemplo, em uma viagem o atleta pode usar as escadas do hotel para se exercitar);

Competição: competir em 1.000 m certamente não é mais fácil do que em 2.000 m podendo ser até mais duro para o remador, já que na prova de 1.000 m o remador passa a maior parte da prova acima do seu limiar anaeróbico, com grande concentração de ácido lático na corrente sangüínea. Isto estabelece uma vantagem aos remadores de maior potência (power-oriented) sobre os de maior resistência (endurance types). O melhor caminho nas provas de 1.000 m é largar na frente, estabelecer um ritmo, relaxar e se concentrar em remar bem. Como você já está em um ritmo alto, não se preocupe tanto com a levantada mas tente tornar cada remada o mais eficiente possível.

Segue a reprodução de uma tabela de handicaps por idade:

Categoria Idades Anos/Categoria Segundos/Ano Segundos/Categoria
A 27-35 9 0,5 4,5
B 36-42 7 1,0 7,0
C 43-49 7 1,3 9,1
D 50-54 5 1,5 7,5
E 55-59 5 1,7 8,5
F 60-64 5 1,9 9,5
G 65-69 5 2,1 10,5
H 70 ou mais 5 2,3

5. BIBLIOGRAFIA

LAMBERT, Craig. Mind Over Water – Lessons on life from the art of rowing. New York: Houghton Mifflin Company, 1998. 184 p.

McARTHUR, John. High Performance Rowing.Ramsbury:The Crowood Press, 1997.56 p.

PADUDA, Joe. The Art of Sculling. Camden: McGraw-Hill, 1992. 149 p.

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